“As estatísticas mais modernas dão conta de que 1 em cada 36 crianças com oito anos de idade está dentro do espectro do autismo. Trazendo esses dados para o Brasil, teremos 6 milhões de crianças autistas. Em Curitiba, 50 mil crianças”. A fala é do presidente da Organização Neurodiversa pelos Direitos dos Autistas, a Onda-Autismo, Fábio Cordeiro, que, nesta quarta-feira (24), participou da Tribuna Livre na Câmara Municipal de Curitiba (CMC).
“Critérios mais bem definidos, acesso ao diagnóstico e mais profissionais qualificados são os fatores para vir aumentando esse número [de pessoas autistas]. Talvez estejamos chegando ao número [real] de porcentagem da população que são pessoas autistas, e que sempre estiveram aí, mas antes não tinham a sua condição reconhecida”, disse o presidente da Onda-Autismo, apontando que se trata de uma condição genética.
Fábio Cordeiro é autista, graduado em Pedagogia e leva projetos de inclusão a empresas de todo o Brasil, a quem leva o selo Empresa Amiga do Autismo pela Onda. Ele foi convidado para participar da Tribuna Livre pelo vereador Dalton Borba (PDT), que não participou da sessão por questões médicas (076.00021.2023). Em seu lugar, o convidado foi recepcionado por Pier Petruzziello (PP), que elogiou o trabalho da organização da sociedade civil.
Um em cada 36
“A gente precisa ‘estourar a bolha’ e falar do autismo além da comunidade do autismo, para que as pessoas entendam que todo mundo está sujeito a ter um parente autista, um filho autista, estudar e trabalhar com uma pessoa autista”, disse Fábio Cordeiro, ecoando a saudação inicial feita pelo presidente da Comissão de Acessibilidade, Pier Petruzziello.
O presidente da Onda-Autismo apontou que a estatística é baseada em diagnósticos feitos nos EUA, mas que não há evidência de determinismo geográfico na ocorrência do autismo, logo é possível aplicar a contagem para o Brasil. Fábio Cordeiro também indicou que o dado é para crianças, “mas o autismo é para a vida toda”. Por isso ele projetou, considerando pessoas no espectro autista de grau leve a severo, e de todas as idades, uma população de até 100 mil autistas vivendo hoje em Curitiba.
“Eu sou uma pessoa autista, tenho 43 anos e cresci em uma época onde não tínhamos o diagnóstico do autismo. Não se falava em inclusão e não havia oportunidade da gente se desenvolver da melhor maneira possível, de forma plena. Sou presidente da maior organização do país, a Onda-Autismo, que trabalha para colocar as leis em prática. Em Curitiba, temos várias leis em relação ao autismo, e eu fico feliz em ver o autismo ser debatido assim”, afirmou.
Intervenção precoce
O convidado da Tribuna Livre contou aos vereadores que tem dois filhos, um de 19 e outro de 17 anos de idade. Usando um jogo de palavras, buscou demonstrar que eles, apesar de diferentes (o mais novo é autista), precisaram de apoio na infância. “Todas as crianças, as típicas e as atípicas, precisam de apoio. Ou alguém já viu uma criança se desenvolver sozinha? Só que a sociedade vê como normal esse apoio às crianças típicas, enquanto para as atípicas, com a desculpa do ‘não sabemos como fazer’, esse apoio é negado”, protestou.
“Daí, só porque a criança aprende de maneira diferente, em tempos diferentes, ela tem seus direitos fundamentais negados. Não podemos mais viver isso nos dias de hoje. Se as famílias têm muita dificuldade para ter o diagnóstico precoce, a ausência não impede a intervenção precoce, porque tem um período de neuroplasticidade cerebral, onde a criança vai ter seu maior desenvolvimento. Isso é uma economia, pois um adulto autônomo não vai precisar de outras manobras, como residência assistida ou BPC [Benefício de Prestação Continuada]”, afirmou Cordeiro.
Lei 12.764/2012
O presidente da Onda-Autismo ouviu perguntas e opiniões dos vereadores Petruzziello, Jornalista Márcio Barros (PSD), Professora Josete (PT), Sargento Tânia Guerreiro (União), Indiara Barbosa (Novo), Rodrigo Reis (União), Marcos Vieira (PDT) e Serginho do Posto (União). Tudo foi transmitido ao vivo pelas redes sociais da CMC, registrando o pedido de Cordeiro aos vereadores para que além do tratamento do autismo, os serviços públicos mais básicos sejam inclusivos, e sugeriu que os vereadores invistam tempo na regulamentação da lei federal 12.764/2012.
“As leis federais preveem o mínimo, nada impede vocês de aumentarem. A vida acontece nos municípios. O Terceiro Setor vem apoiar, para transpassar a burocracia, mas nem sempre ela consegue. A Onda-Autismo oferece treinamento. Como cidadão, eu vou cobrar, mas como organização [da sociedade civil] eu vou apresentar soluções. O autismo é a maneira como a pessoa existe no mundo. E quando a gente consegue dar o atendimento devido, suplantamos as coisas difíceis para poder viver as coisas bonitas do autismo”, disse.
Tribuna Livre
A Tribuna Livre é o espaço democrático de debates mantido pela CMC para ser o canal de interlocução entre a sociedade e os parlamentares. Os temas em pauta são sugeridos pelos vereadores, que, por meio de um requerimento, indicam uma pessoa ou uma entidade para discursar e para dialogar no plenário. As falas nesse espaço podem servir de prestação de contas de uma entidade que recebe recursos públicos, de apresentação de uma campanha de conscientização, de discussão sobre projeto de lei em trâmite na Casa, entre outros.
Conforme o Regimento Interno (RI) do Legislativo, as Tribunas Livres ocorrem nas quartas-feiras, durante a sessão plenária, após o espaço do pequeno expediente. Se você participa de uma entidade, representa uma causa ou atividade coletiva, entre em contato com um dos vereadores para sugerir a realização da Tribuna Livre. O RI veda a participação de representantes de partidos políticos; candidatos a cargos eletivos; e integrantes de chapas aprovadas em convenção partidária.
Fonte : Câmara Municipal de Curitiba (Foto: Rodrigo Fonseca/CMC)