Simpósio discutiu dificuldades das pessoas com TDAH, necessidade de informar a sociedade sobre o transtorno e ausência de políticas públicas para atender essa população
O Primeiro Simpósio Paranaense sobre TDAH, realizado na última terça-feira 21, no Plenário da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), trouxe a visão de especialistas e o testemunho de pais atípicos e de pessoas neurodivergentes sobre essa condição neuropsiquiátrica que surge na infância e acompanha a pessoa durante a vida inteira e que ainda é pouco conhecida pela sociedade. Com o tema “Visão geral e desafios sobre o Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade”, o evento organizado pelo Bloco Parlamentar da Neurodiversidade e a Escola do Legislativo, abriu um amplo debate sobre as dificuldades das pessoas com o TDAH, a necessidade de chamar a atenção da sociedade para a compreensão do transtorno, a carência de leis e de políticas públicas para atender a esse público e a urgência de se promover a verdadeira inclusão. Entre os principais sintomas do TDAH estão a desatenção, a dificuldade de gestão de tempo, a impulsividade, a hiperatividade e a distração.
Proponente do evento e líder do Bloco Parlamentar Temático da Neurodiversidade, o deputado estadual Alisson Wandscheer destacou a resposta do público ao simpósio. “Fiquei muito feliz com os resultados do nosso simpósio, demonstrando que mesmo sendo um tema ainda muito desconhecido, as pessoas têm a necessidade de se informar, de saber mais sobre o TDAH e a neurodiversidade.”
O parlamentar falou sobre a incompreensão, que gera preconceito e exclusão. “É um assunto contemporâneo, mas que ainda existe pouca informação a respeito. Um déficit de neurodesenvolvimento é geralmente incompreendido, uma criança com este transtorno é muitas vezes vista como burra ou cabeçuda, como diziam antigamente. Mas, na verdade, a criança não consegue se adaptar a nada, não consegue se concentrar. O que geralmente falta é um diagnóstico assertivo. Na sociedade falta informação, falta inclusão e falta empatia”, afirmou.
Alisson Wandscheer foi diagnosticado com o transtorno já adulto e tem três filhos com TDAH. Por isso, deu o seu testemunho e falou dos desafios enfrentados em família, situação que se repete em milhares de lares brasileiros. Estatísticas apontam que 2 milhões têm o transtorno e de 5% a 8% da população mundial.
Ele também reforçou a importância de levar informação para a sociedade. “Nós estamos fazendo esse evento para trazer mais informação e começar a observar o que é o TDAH em várias condições e sobre vários aspectos. Tivemos aqui muitos depoimentos de situações, angústias e tipos de TDAH. Eu sou um TDAH, eu tenho esse transtorno, então eu sei as angustias, as dificuldades e os desafios.
Alisson contou que a sua condição neuroatípica e de seus filhos, o levou a trabalhar pela causa. “Isso me fez propor o Bloco Parlamentar da Neurodiversidade, para que possamos debater o tema que não é apenas o TDAH, é o autismo, é a dislexia, e tantos outros. Muitos nem sabem o que é neurodiversidade, desconhecem as dificuldades que os neurodivergentes sofrem, que um autista sofre dentro de uma sala de aula, que uma criança com o transtorno do déficit de atenção passa ao ter que ficar sentada durante horas. É um assunto de extrema importância. Queremos ampliar o entendimento e a informação e com isso trazer empatia e gerar inclusão”, explicou o deputado.
“É importante quando nós conseguimos disseminar informação e atingir aquilo que queremos, que é inclusão” – Alisson Wandscheer.
Além de destacar o simpósio, o diretor da Escola do Legislativo da Assembleia Legislativa, Dylliardi Alessi, chamou a atenção para as dificuldades que as pessoas com TDAH enfrentam pela falta de informação e de assistência. “Esse é o nosso primeiro simpósio sobre o TDAH e espero que seja o primeiro de muitos, porque é um problema de saúde pública que demanda muita educação. É preciso que os profissionais de educação, os profissionais de saúde, as famílias, a própria pessoa com o transtorno tenha conhecimento sobre como esse problema pode ser tratado e observado, especialmente os mais jovens, para que as soluções sejam encontradas”.
Palestrantes
Yuri Maia
O 1º Simpósio Paranaense sobre TDAH reuniu especialistas reconhecidos na área, pessoas neurodivergentes, pais atípicos, que compartilharam seus conhecimentos, experiências e angústias. Nas abordagens, o desconhecimento da sociedade sobre o transtorno, a ausência de leis e políticas públicas, a carência de profissionais de saúde e educação especializados para atender pessoas com TDAH, os impactos na vida e a importância de um olhar mais amplo sobre as questões relacionadas à neurodiversidade e à saúde mental.
Referência no campo do TDAH e fundador do Instituto TDAH Descomplicado, Yuri Maia, falou sobre as “Vivências, estatísticas e Políticas Públicas para o TDAH Adulto”. Para ele, o simpósio trouxe muitas informações para a sociedade entender o que é TDAH. “Os principais desafios da questão do TDAH vem principalmente do esclarecimento da sociedade. Muitas pessoas não têm ideia exatamente do que é o TDAH, o que acaba acarretando, também por uma falta de conhecimento e esclarecimento, a falta de políticas públicas. Políticas públicas sérias é o que nós precisamos para a causa TDAH, inclusão de verdade, trazer esclarecimento não apenas na escola, como se o TDAH fosse apenas uma questão escolar, mas também na vida adulta principalmente com medidas inclusivas. É isso que está faltando”, disse.
Yuri falou da sua própria vivência. “Fui diagnosticado aos 7 anos de idade, passei por diversas dificuldades, desde a alfabetização, na escolinha, passando pela adolescência, na universidade demorei 8 anos para formar, uma vida de tropeços. Na vida profissional também. Fui demitido várias vezes, fui quase demitido de um concurso que tinha feito. A vida do TDAH ela vem com muita dificuldade e por mais que você tenha acesso a algum tratamento, se ele não for de qualidade, não for completo, você pode estar realmente fadado a uma vida muito complicada e com muitos tropeços”, contou.
Dra. Mara Cordeiro
Diretora de Relações Institucionais do Instituto Pelé-Pequeno Príncipe, a doutora Mara Cordeiro destacou o evento e mostrou como o hospital acolhe pacientes com TDAH. “Esses Seminários são muito importantes, porque as crianças com TDAH e suas famílias sofrem muito, porque os sintomas de déficit de atenção e hiperatividade, às vezes, são confundidos com uma criança mal educada, e, na realidade, é uma criança que está sofrendo, que tem um transtorno neurobiológico e que precisa de um diagnóstico correto e de um tratamento correto, tanto para ajudar a criança quanto a família.”
“Nós, lá no Instituto de Pesquisa Pelé Pequeno Príncipe, já atendemos mais de 1.500 crianças gratuitamente com vários problemas de déficit de atenção, de falha de agenda escolar. Num desses projetos, com o apoio da Secretaria de Estado da Ciência Tecnologia e Ensino superior (SETI), publicamos o livro, “O que é TDAH, Como Entender e Ajudar Seu Filho”, que foi fruto de pesquisas e distribuímos por todas as escolas de Curitiba gratuitamente. Porque é muito importante falar sobre o assunto para diminuir o estigma e ajudar as famílias e as crianças que sofrem”.
Fabiana Longhi
Fabiana Longhi Vieira Franz, mãe atípica, advogada especialista em Direitos da Pessoa com Deficiência, integrante da Regional Sul Autismo da Associação Brasileira de Advogados (ABA) e da Comissão dos Direitos da Pessoa com Deficiência da OAB/PR, palestrou sobre o tema “A importância do conhecimento sobre TDAH para o acolhimento e empatia das crianças”.
“Nós precisamos trabalhar com maior afinco no que diz respeito à questão da inclusão nas escolas. As próprias escolas não estão capacitadas, não estão preparadas para a inclusão de indivíduos das mais diferentes formas de transtornos de neurodiversidade. Quando o nosso filho tem algum tipo de necessidade específica, ele é simplesmente deixado no fundo da sala como uma caixa de Lego para ele não atrapalhar os outros. Então isso é muito difícil para nós, mães atípicas. E é algo que é bastante rotineiro, é bastante comum na vida de todas as famílias atípicas terem que enfrentar essa questão com relação às escolas.”
“Existe a questão escolar, a questão da inclusão, mas também a necessidade de acompanhamento multidisciplinar terapêutico. Nós temos a questão do SUS com longas filas de espera, nós temos a questão dos medicamentos, nós temos uma lista de medicamentos que não abrange o TDAH e, além disso tudo, nós temos a questão da saúde suplementar, os planos de saúde não tem uma cobertura para este tipo de demanda. Apesar do TDAH estar no rol da classificação internacional das doenças (CID) é preciso esta cobertura por parte dos planos de saúde. Por isso a ampliação de políticas públicas, e esta discussão do tema aqui na Assembleia Legislativa”, completou.
Carolina Abati
Pesquisadora colaboradora no Centro de Neuropediatria – Ambulatório de TDAH e Transtornos Disruptivos do Hospital de Clínicas da UFPR, a psicóloga especializada em saúde mental Carolina Correia Abati trouxe o tema “Na psicologia quais são os desafios de viver com TDAH?”.
“Quando a gente pensa em TDAH na primeira infância e TDAH de forma geral, a gente tem um curso de desenvolvimento da pessoa que o TDAH também acompanha. Temos, então, uma categorização diagnóstica que vai alterando conforme a fase do desenvolvimento. Aí, quando a gente olha para o TDAH na fase adulta, encontra pessoas envolvidas com comportamentos compulsivos, e uma série de prejuízos acumulados que poderiam ter sido vistos. É quando observamos comportamentos de risco, uso e abuso de substâncias, e o tratamento chega para a outra sintomatologia que surgiu e não necessariamente para o TDAH.”
Por isso, ela frisa que o diagnóstico precoce na infância traz qualidade de vida para essas pessoas. “Se a gente olha para isso na infância, olhamos para a função executiva, para o estímulo, para fornecer base para esse desenvolvimento para que essa criança cresça de forma saudável, evitando que venha desenvolver problemas em função do TDAH na idade adulta”, disse.
Marcio Oliveira
A relação entre TDAH e atividades físicas foi abordada pelo professor de educação física e especialista em análise do comportamento autismo e deficiência mental, Marcio Oliveira.
O profissional cumprimentou o deputado Alisson Wandscheer pela realização do simpósio. “A iniciativa do deputado Alisson é essencial para o conhecimento e divulgação do que é transtorno TDAH e quais são as dificuldades que esse público apresenta na sua vida diária. É importante para o conhecimento da população sobre o diagnóstico do TDAH”, destacou.
Na sua apresentação, Marcio Oliveira afirmou que o exercício físico deve ser estimulado na primeira infância. “Isso porque através da rotina da atividade física os frutos em relação à autorregulação são muito benéficos para o indivíduo com o transtorno. O exercício físico deve fazer parte da rotina de uma pessoa com TDAH e para isso os profissionais de educação física são os mais capacitados para ensinar os familiares de como inserir exercícios na rotina de uma pessoa com TDAH.”
Questionado se os profissionais de educação física estão preparados para atender essas pessoas, ele afirmou que não estão. “Existe uma defasagem em relação ao quanto o profissional de educação física é qualificado para ensinar. Na formação, ele é capacitado para ensinar o público em geral. Quando uma pessoa com transtorno do neurodesenvolvimento está na classe, nem sempre ela é estimulada de forma adequada. A capacitação dos profissionais que trabalham com educação infantil, não só na educação física, mas nos anos iniciais, é imprescindível para que essa criança tenha maiores chances de avançar junto com a turma”, disse.
Ana Regina Braga
Mestre em Educação e Psicopedagogia, Ana Regina Braga falou sobre “As dificuldades do TDAH na vida escolar”, trazendo sua experiência como palestrante na área da inclusão, professora e autora de materiais didáticos na área da psicopedagogia e educação especial.
“A nossa escola passa por uma transição de entender cada vez mais quais são as estratégias que precisam ser utilizadas, inclusive qual o tipo de formação que o professor precisa ter para atender os alunos com TDAH. O nosso grande objetivo é ter a criança com TDAH aprendendo, que ela também tenha esse direito de aprender com qualidade. Algumas estratégias diferenciadas, como o currículo adaptado, o apoio da sala de recursos multifuncionais quando a escola é pública, na particular, ter os atendimentos também especializados, a questão do tutor quando necessário. Então, tudo isso precisa ser muito bem conversado conosco, psicopedagogos e psicólogos, e os professores terem essa consciência.”
“Outra lacuna é a questão do diagnóstico, esse encaminhamento, as testagens que precisam ser feitas até nós chegarmos no ponto final desse diagnóstico com uma segurança muito grande, para não camuflarmos qualquer situação. Nós temos crianças pequenas sendo diagnosticadas precocemente, o que é muito bom para termos tempo dessa criança ser um adolescente, um adulto que tenha uma vida com qualidade na sua aprendizagem, na sua essência de vida na sociedade.”
Letícia Pan
“TDAH na Polícia Militar do Paraná” foi o tema abordado pela tenente-coronel da Polícia Militar do Paraná, Letícia Chun Pei Pan, MBA em Gestão de Saúde pelo Hospital Albert Einstein.
Para ela, o debate sobre o TDAH é importante. “Traz à tona a alta incidência de casos que nós temos entre crianças e familiares e, inclusive, entre os adultos na Polícia Militar do Paraná. Esses distúrbios do neurodesenvolvimento precisam ser discutidos e precisam ser falados, especialmente numa corporação tão tradicional, tão conservadora e tão importante para o Estado. O comando da corporação entende que a atenção aos policiais militares com TDAH é prioritário. E nós temos toda a estrutura própria do Hospital, uma rede credenciada especializada em terapias infantis especiais”, disse.